Incompreendido e não reconhecido em vida, Augusto dos Anjos (1884-1914) ganha sua mais completa antologia. Em Toda poesia de Augusto dos Anjos, prefaciada por ensaio crítico de Ferreira Gullar, encontram-se os poemas de Eu, único livro publicado em vida pelo autor, e trabalhos até então inéditos. Frequentemente apontado com um dos escritores que influenciaram o Movimento Modernista, Augusto dos Anjos ficou conhecido pelos versos ácidos e fortes, comparados a de ícones como Edgar Allan Poe e Charles Baudelaire. Tais características estão presentes em toda a sua obra, como o leitor pode comprovar nesta compilação definitiva. Além dos 58 poemas de Eu, o leitor poderá apreciar verdadeiros achados inéditos. Alguns deles, como A caridade, que encerra o livro, foram escritos poucos meses antes de o autor morrer. Apesar de terem sido escritos há quase um século, os versos de Augusto dos Anjos mostram-se atuais. Sem dúvida, uma obra de importância ímpar.
Editora: José Olympio l 320 Páginas l Poesia l Compare & Compre: Saraiva • Amazon l Skoob l Classificação: 4,5/5
Confesso que sou leiga quando o assunto é poesia e que não tenho costume de ler esse tipo de obra. Portanto, e exatamente por isso, quis ler Toda Poesia de Augusto dos Anjos não apenas para conhecer mais sobre os poemas de um dos nomes mais renomados da literatura brasileira, como também para sair da minha zona de conforto e ler algo completamente diferente do que estou acostumada. E o ponto é que não só cumpri meu objetivo, como também terminei a leitura extasiada por ter tido a possibilidade de conhecer a história do Augusto dos Anjos, ter mergulhado em seus poemas verdadeiramente cruéis, e ter me encantado por um novo – pelo menos para mim – estilo de leitura.
A obra pode ser dividida em três partes: Prefácio sobre o poeta Augusto dos Anjos; Coletânea de poemas que fazem parte do livro “Eu” (o único publicado em vida pelo autor); e Reunião final com poemas até então inéditos.
No prefácio com um estudo crítico de Ferreira Gullar temos: a apresentação de quem foi Augusto dos Anjos, uma discussão sobre o período em que o autor viveu, e divagações sobre as peculiaridades de sua narrativa. O ponto abordado é que Augusto dos Anjos (1884 – 1914), paraibano, filho de senhores do engenho, viveu em um período de decadência social. Se antes o engenho era a grande fonte de trabalho e dinheiro, agora a estrutura é substituída pelas usinas de cana-de-açúcar. Além da mudança social, Augusto também vivenciou um período de abolição da escravatura, proclamação da República, a consolidação do capitalismo e o agravamento da miséria do povo. Portanto, perante uma sociedade em declínio, Ferreira Gullar defende que Augusto dos Anjos modifica a estrutura da literatura poética ao falar sobre o homem e suas dores da vida real.
Desta forma, conforme vamos lendo os poemas do autor – tanto os que compõem o livro “Eu” quanto os inéditos – percebemos o quão crítico Augusto dos Anjos era e o quanto ele almejava uma mudança para a sociedade. O poeta fala com uma propriedade incrível sobre os erros humanos, comparando-os com vermes que, sem mudança ou sem fé em Cristo, não serão capazes de ressurgir e terão fim na morte. Além disso, os escritos de Augusto refletem quem ele foi e parte da sua história de vida. Vários de seus poemas falam de suas experiências: a morte do pai, a ama de leite que o amamentou, as idas e vindas por cidades perdidas em meio a um período de tantas mudanças, a morte prematura do filho, a visão de uma sociedade sem fé, corrupta e comprada pelo dinheiro e pela luxúria, e assim por diante. Portanto, tais poemas refletem o que o homem tem de pior e, exatamente por isso, chegam a ser atemporais. As reflexões do autor cabem até hoje, pois infelizmente, a humanidade continua corrompida e perdida em pecados do corpo e da alma.
Os poemas de Augusto dos Anjos são cheios de raiva, dor e mágoa. Eles falam sobre morte, pobreza, pecado, fé, prostituição, solidão, e inúmeros outros temas reflexivos e reais. Surpreendi-me com o teor crítico da escrita do autor, e principalmente pelo fato de seus poemas conseguirem transmitir a confusão de sentimentos que ele vivenciava enquanto escrevia. Foi uma leitura rica em emoções, cheia de “tapas na cara” e meditações sobre o comportamento do homem, e uma oportunidade de conhecer quem foi Augusto – pois, apesar de seus poemas serem universais, eles refletem a alma desse poeta e nos permitem conhecer melhor o escritor, sua vida e seus dilemas. Definitivamente senti, durante toda a leitura, que estava mergulhada em um período social repleto de medo, perdas e dor. Foi incrível!
Confesso que a leitura do livro foi rápida – afinal estamos falando de poemas – mas ao mesmo tempo difícil. Augusto usa várias metáforas que eu não fui capaz de compreender, de forma que nem todos seus poemas, por mais que eu repetisse a leitura, ficaram claros para mim. Sei que não absorvi toda a mescla de emoções passada pelo autor exatamente por não entender muito do que ele escreveu, e sei também que me faltou conhecimento de sua estrutura linguística e até mesmo da literatura brasileira como um todo. Porém, ainda assim, a experiência valeu muito apena. Mesmo não entendendo todos os poemas, os que fui capaz de compreender me impactaram o suficiente. Sendo assim, para quem gosta de livros que nos tiram da zona de conforto, eis uma leitura mais que recomendada.
Beijos!
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